Devido ao número de e-mails recebidos reproduzo abaixo artigo que publiquei no diário LANCE! na última terça, apenas para a leitura de vocês, seguido de três observações:
“O mundo do futebol que muitos pregam que poderia ser o da união e aproximar os diferentes segue marcado pela intolerância. Reflexo da sociedade, assim como as nojeiras publicadas em redes sociais por gente que aposta num suposto anonimato.
Domingo retrasado fui acompanhar São Paulo e Corinthians e fiquei impressionado (porque sempre impressiona) com o rancor das pessoas, os xingamentos, a homofobia. A cada tiro de meta que Cássio cobrava era o estádio do Morumbi inteiro gritando “bicha”. A cada lance polêmico da arbitragem alguém (ou uma multidão, no caso) reclamava, chamando o juiz de “veado”, mandando os auxiliares enfiarem a bandeira naquele lugar, dizendo que eram filhos disso e daquilo. E havia crianças no jogo. Também gritando. Acompanhadas de pais, avós, tios, cidadãos de classe média, classe média/alta, pois vi a partida das cativas, e ninguém dava o exemplo.
Perto de onde eu estava um molequinho de menos de dez anos a cada duas palavras que dava três eram palavrões. Chamava os corintianos de “bichas”, “veados”, “travecos” e os adultos achavam divertido, até porque faziam o mesmo.
Não é de hoje que o futebol é um reduto homofóbico e machista também, um universo cheio de preconceitos, inclusive de classe (os são-paulinos insistem em chamar os corintianos de favelados), onde as pessoas mostram aquilo que têm de pior. E deseducam as novas gerações.
Pensei muito nessa questão não apenas no clássico de domingo retrasado, mas também ao ler o livro “Baseado, Chopp & Cia.”, escrito por Nelson Hamerschlak, médico hematologista do Hospital Israelita Albert Einstein, instituição referência no Brasil. Na obra Hamerschlak conta sua experiência ao descobrir que tinha um filho gay. Algo que para ele, especialmente no início, foi extremamente traumático.
O livro é interessante porque fala das diferenças, do olhar para o outro e da importância de pararmos de segregar quem quer que seja pela cor da pele, orientação sexual, deficiência física ou mental, religião, país de origem…
Chamou minha atenção a dificuldade que o médico teve para aceitar a homossexualidade do próprio filho. Um filho a gente acolhe, gay ou não. E ele teve enormes problemas para superar seus próprios preconceitos, precisou de anos e anos de terapia para lidar com uma questão que, num mundo civilizado, deveria ser bem mais simples.
Infelizmente, porém, na sociedade em que vivemos, muitos são criados para discriminar. E o futebol, que poderia ser um instrumento de aproximação, porque é um esporte, pelo menos em tese, democrático, acaba servindo para outros interesses.
Muito torcedor que vai ao estádio resolve “extravasar”, como se tivesse o direito de fazer qualquer coisa simplesmente por ter pago o ingresso, quando não pode. E aí destila preconceito e mais preconceito.
Isso acontece também na imprensa esportiva, mas nos bastidores. O que já ouvi de profissionais da mídia proferindo comentários homofóbicos e machistas não está escrito. E a homofobia, por exemplo, é algo que deve ser combatido inclusive por eles, óbvio. Mas parece que preferem se calar publicamente sobre a questão. Como se fosse de menor importância, quando não é. É gravíssimo, vide o número alarmante de pessoas mortas por sua orientação sexual num país provinciano como o Brasil.”
Notas:
Endinheirados: No jogo Brasil x Paraguai a torcida voltou a dar mau exemplo. E a arena do Corinthians estava cheia de gente de grana, que gastou até mais de um salário mínimo para ver Neymar e Cia. em ação. Sinal de que dinheiro e boa educação não andam de mãos dadas, muito longe disso. A cada bola devolvida pelo goleiro paraguaio lá vinham os brasileiros a gritar “bicha”. E pelo jeito não adianta a Conmebol multar;
Coisa de chato?: Sei que muito jogador (e muito jornalista também) pensa que o futebol está ficando chato, pois o “politicamente correto” estaria prevalecendo. Não sou favorável ao “politicamente correto”, mas a respeitar o próximo, seja ele branco, negro, judeu, muçulmano, ateu, hetero, homossexual, rico, pobre… Jogador não precisa ficar de mimimi, deve falar o que pensa, desde que respeitando os outros;
Polêmicas: As discussões entre são-paulinos e corintianos em redes sociais beiram o ridículo, com os primeiros atacando os segundos dizendo que são favelados, como se quem mora em favela, morro ou comunidade valesse menos do que quem habita condomínios de luxo, por exemplo, e os corintianos chamando os tricolores de “bambis”. São marmanjões dos dois lados agindo como imbecis.
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